terça-feira, 19 de janeiro de 2010

Leitura Espiritual da Introdução de "Anarquismo e Cristianismo" de Jacques Ellul

Leitura recomendada:
"Sou cristão, não por ascendência, mas por conversão"

  • Muitos cristã(o)s, inclusive cristã(o)s libertárixs, afirmam assim ser devido ao fato de pertencerem a um lar e criação cristã(o)s. Porém as escrituras são bem claras, ser cristã(o) independe dos valores nos quais somos criadxs, pois não é uma questão de moral, valores ou costumes, mas de fé em Cristo, no Verbo.
  • Este trecho também demonstra a fé de Ellul na conversão, não como mudança de obras, mas como restauração da comunhão com Deus através da obra de Cristo.
"... e como havia na Bíblia uma orientação para um certo anarquismo"
  • A postura de Ellul se estreitava claramente com o Cristianismo Libertário. Ele não só se inclinava ao Anarquismo Cristão, ou seja, tinha "a anarquia de um ponto de vista cristão", como tinha seu anarquismo como conseqüência de um Cristianismo Libertário, em outras palavras, tinha a Bíblia como base de verdade que ratificava sua ideologia.

"... o teólogo que havia me formado, Karl Barth"
  • Ellul, por mais que discordasse da visão de Karl Barth sobre autoridade, reproduz sua teologia, desconstruindo só o necessário.

"Qual é o meu propósito ao escrever estas páginas?"
  • Em seu primeiro esclarecimento acerca da questão levantada, Ellul afirma não ter pretensões proselitistas e opõe-se a essa prática, contrariando certa visão de conversão, encarada como mudança de obras, afirmando que, segundo certos versículos bíblicos, ao crermos somos salvxs. Contrariando a visão Calvinista, Ellul afirma que a salvação é para todxs e pela graça - com isso não afirma que Deus faz vista grossa para o pecado e não será justo, mas que a salvação está disponível gratuitamente a todxs que assim desejarem. Ellul também não nega a conversão -pois como já foi visto, ele mesmo afirma ser um "cristão por conversão"- ao contrário, a reafirma dizendo que sua conseqüência são obras de comprometimento "com um certo padrão de vida e um certo dever que Deus requer de nós". Isso, segundo ele, mostra que ser cristã(o) não é ser melhor que ninguém, mas ter mais responsabilidade e trabalho. E nesta visão deturpada, ele não se empenha em proselitismo.
  • Em um segundo esclarecimento, Ellul demonstra não ser partidário da ideia que para ser cristã(o) é necessário ser anarquista. Porém, mesmo reconhecendo isto, recomenda que x primeirx não exclua o segundo.
  • No esclarecimento posterior, Ellul trata do humanismo. Ele condena enfaticamente a postura de cristã(o)s adeptos de doutrinas sociais que, no anseio de conciliá-las com sua fé, enfatizando "qualquer coisa que o cristianismo dissesse sobre a pobreza, justiça social, sobre tentativas de mudar a sociedade e etc, negligenciaram o que achavam desconfortável – a proclamação da soberania de Deus e a SALVAÇÃO EM JESUS CRISTO" (prática muito comum na teologia da libertação). Outro exemplo, mais freqüente no protestantismo racional do século XX, é a afirmação que " devemos abandonar tudo o que for contrário à ciência e à razão, por exemplo, a possibilidade de Deus ter encarnado em um homem, juntamente com os milagres, a ressurreição, etc." Em um exemplo mais recente, ele cita o desejo de conciliação entre cristã(o)s e muçulmanxs, através da insistência "em dois pontos de acordo, por exemplo, que as duas religiões são monoteístas e ambas são religiões do livro, etc. Nenhuma referência é feita ao ponto de conflito, ou seja, JESUS CRISTO. Eu me pergunto por que eles ainda chamam sua religião de cristianismo."
  • Ou seja, o objectivo de Ellul ao escrever esta obra não é fazer com que anarquistas se tornem cristã(o)s, nem o inverso, e muito menos conciliar as duas doutrinas, pois ele demonstra claramente que não cede em relação a sua fé nas discordâncias desta com o anarquismo, mas trazer uma óptica cristã sobre o anarquismo (Anarquismo Cristão), mostrando o erro da instituições eclesiásticas em tolerar "injustiças sociais e a exploração de pessoas umas pelas outras, declarando que é vontade divina que alguns sejam senhores e outros servos", respeitando escrupulosamente e oferecendo "suporte à autoridade do Estado", ou afirmando "que sucesso sócio-económico é um sinal externo de bênçãos divinas" (como se pode ver de forma acentuada na antiga teologia Calvinista do século XVI ou na recente teologia da prosperidade do século XX); ou instituindo "um clero equipado com conhecimento e poder, embora isso seja contrário ao pensamento evangelizador, como foi inicialmente realizado quando os clérigos eram chamados de ministros, o ministério sendo serviço e o ministro um servo dos demais. Por isso, devemos eliminar dois mil anos de erros cristãos acumulados, ou tradições enganadas", sem "esquecer os movimentos populares, a constante existência de pessoas humildes que viveram uma fé e uma verdade que era diferente daquela proclamada pela igreja oficial, e que achava sua fonte directa mais no Evangelho do que no movimento colectivo. Essas vítimas humildes mantiveram uma fé real e viva sem serem perseguidas como hereges, pois não causaram escândalos. O que estou adiantando, não é uma redescoberta da verdade. Ela sempre foi mantida, mas por um pequeno número de pessoas, na maioria anónimas, embora seus traços permaneçam. Elas sempre estiveram lá mesmo que constantemente apagadas pelo cristianismo oficial e autoritário dos dignitários da Igreja. Sempre que tentaram lançar uma renovação, o movimento começado nas bases do Evangelho e de toda a Bíblia foi rapidamente pervertido e reencontrou seu caminho na conformidade oficial".

"O pai de minha esposa, que foi um não-cristão obstinado, me contou quando tentei explicar para ele a verdadeira mensagem do Evangelho, que fui o único a lhe dizer isso, que ele só ouvira isso de mim, e o que ouvia nas igrejas era o extremo oposto."
  • Neste texto, Ellul demonstra que um motivo para pregarmos a verdadeira mensagem do Evangelho: muitos não são cristã(o)s porque só tiveram acesso ao oposto ouvido nas instituições eclesiásticas.
- REFERÊNCIA BIBLIOGRÁFICA:
ELLUL, J. Anarchy and Christianity [Anarquia e cristianismo]. Grand Rapids: Eerdmans, 1991. [Traduzido e adaptado por Filipe Ferrari].
- Os trechos em itálico e vermelho entre aspas pertencem ao livro já citado; a mudança na formatação para negrito ou maiúsculas é de minha autoria.